Reportagem
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O que é voltar ao Colégio Valsassina: o almoço dos antigos alunos.
por Vera Appleton Há idades em que vivemos de costas voltadas para o passado, até porque ainda não temos passado, somos demasiado novos. Andei 12 anos no Valsassina, dos 3 aos 15, e só lá voltei com 38. Durante esse período afastada e imagino que como a maioria dos meus colegas, pouco pensava nas saudades daquele lugar, o Colégio onde formei o meu carácter, já que vivi lá diariamente todos os anos da minha infância e grande parte da minha adolescência. Não me arrependo desses anos de ausência apenas porque tornaram o meu regresso muito mais emocionante. Hoje, agradeço esse regresso que nunca imaginei acontecer nesta fase da minha vida. Desde Julho, altura em que me envolvi na organização da homenagem ao Fifas, até sábado passado, com o almoço que promoveu mais um encontro anual de antigos alunos, já voltei ao Valsassina vezes suficientes para compensar todos aqueles anos afastada. No dia do almoço andei a passear pela quinta das Teresinhas. A fazer visitas guiadas a todos os lugares a que conseguia chegar, de uma ponta à outra. Lembrei-me daqueles códigos do Valsassina que só eram conhecidos por nós – afinal aquele era o nosso mundo, a nossa casa, a nossa vida. Só quem andou no Valsassina é que trata as auxiliares por “meninas”, só quem andou no Valsassina é que sabe o que são as montanhas, só quem andou no Valsassina é que se lembra da menina dos cachorros e coca-colas, lá em cima ao pé da entrada, ou do cacifo do Senhor Luís cheio de guloseimas. Só quem andou no Valsassina desde pequenino é que acha que o balcão da secretaria onde os nossos pais pagavam a mensalidade tinha no mínimo 1,80m de altura. Só quem andou no Valsassina é que reage àquele cheiro intenso a eucalipto. Lembro-me de achar aqueles dias intermináveis, e que a minha vida seria assim para sempre. Estes encontros anuais de antigos alunos servem um pouco para prolongar essa ideia. Temos o Valsassina em comum, todos conhecemos esses códigos entre tantos outros, e parecendo que não, o facto de nos juntarmos preserva a memória e permite a partilha de qualquer coisa que pode viver em nós para sempre, não no dia-a-dia, mas de uma outra forma, mais profunda e mais perene. Nunca tinha participado nestes encontros por isso foi surpreendente sentir a união entre gerações tão diferentes, ver caras conhecidas que nem sabíamos que eram antigos alunos, rever outras caras de pessoas que por serem mais velhas nunca tinham trocado uma palavra connosco, mas que ali trocaram. Ultrapassaram-se barreiras, preconceitos, tudo o que faz parte dessas idades em que andamos no colégio, e sentia-se essa energia comum a todos: a vontade de gozar aquele lugar cheio de memórias e histórias, e fazê-lo descontraidamente, sem pressas, com genuíno prazer. Ainda antes do almoço fiquei especialmente emocionada ao assistir à homenagem da Professora Maria Alda, homenagem que ganhou um sentido diferente por ser organizada pelos antigos alunos. Os bons professores merecem isso e muito mais. A minha Mãe era professora e lembro-me que cada vez que encontrava um antigo aluno que manifestava gratidão ou afeição por ela, o sentia como uma pequena grande homenagem, e que rapidamente o partilhava connosco. Aprendi com a minha Mãe que o reconhecimento dos professores por parte dos alunos é o seu maior prémio, mas que isso geralmente só acontece mais tarde, com uma certa “décalage” temporal. Gostei de ouvir cada palavra dedicada à professora Maria Alda, o respeito e o carinho manifestados, as imagens como pano de fundo, tão bem escolhidas, e a própria, que nos disse, através da poesia e de uma forma tão bonita, que era grata pelo tanto que a vida lhe tinha dado. Tenho a certeza que aquele dia contribuiu para isso. Que tal como com a minha Mãe, nem era preciso tanto, bastava o sorriso, o abraço, a palavra. Mas foi tanto e tão bom. Apeteceu-me ir ter com professores antigos só para lhes dizer “obrigada”. Fiquei então com a certeza da importância daquele encontro. A importância de reviver memórias no nosso Colégio que nos permitem sentir, através de uma espécie de viagem no tempo, o que é ser criança outra vez. A importância de voltar, com espírito de festa, alegria, descontracção, celebração e homenagem, a um lugar que habitámos diariamente durante anos para reencontrar pessoas com quem partilhamos a ligação a esse lugar. E neste caso esse lugar tem um nome que nos marca a todos: é o Valsassina. Vera Appleton na Direcção da Associação dos Antigos Alunos do Valsassina desde 2015 |